Você se acha bonito? Sobre as obras inacabadas

Você se acha bonito? Sobre as obras inacabadas

Essa é uma pergunta que todo mundo já se fez. Para dissecar essa grande questão da humanidade, vou recorrer a um causo contado por uma amiga. Ela me disse que evitava dates com homens com o abdômen muito definido porque isso demonstra um desequilíbrio. 


“Se o dia de todo mundo tem 24 horas, todo mundo sabe o quão trabalhoso é construir e manter o tanquinho perfeito, esse é um indicador, para mim, que o foco todo dele estava só ali no tanquinho, sem muito interesse em outras coisas que fazem um homem ser bonito”.


Eu tendo a discordar dessa ideia porque conheci gente na vida que precisa de pouco esforço para chegar no ponto do tanquinho que a minha amiga se referiu. Mas algo que foi determinante durante esses anos de VITO foi entender questões mais profundas sobre a masculinidade, tanto da perspectiva das evoluções sociais quanto das nossas próprias.


Saúde mental tinha sido um ponto grande na minha vida, então deu para colocar um pouco disso na construção da marca e agregar com os pontos que eram importantes para a nossa sociedade, porque o Rafa é um cara evoluído e tem valores claros sobre os pontos que nos levaram a criar o slogan que resumia a história toda: O PARA ESTAR BEM. Você já deve ter visto ele em alguma embalagem nossa.


Com o tempo, com a idade, você vai entendendo melhor o que importa para você e vai mudando alguns conceitos. Fui entendendo que todo mundo tem suas questões em relação ao próprio corpo e com seu conceito de beleza. Uma coisa que entendi é que, via de regra, no mundo hétero, os homens querem ficar bonitos para as mulheres e as mulheres querem ficar bonitas para as…mulheres.


Pode ser uma ideia errada, pode não ser nem 90% verdade, mas aqui tem um ponto que parece ser importante: você pode estar querendo parecer bonito para alguém que realmente não está se ligando muito nisso. E isso parece ser um ponto-chave.


Quando Vinícius de Moraes disse que as feias que o perdoassem, mas que “beleza é fundamental”, acredito que ele tenha sido incompreendido por muita gente, ou que ele tenha precisado de mais tempo para depurar essa ideia. A frase faz parte do samba “as feias que me perdoem”, lançado em 1957 e, dez anos depois, Vinicius lançou o samba de benção, em que a letra é a seguinte:


“É melhor ser alegre que ser triste

Alegria é a melhor coisa que existe

É assim como a luz no coração

Mas pra fazer um samba com beleza

É preciso um bocado de tristeza

É preciso um bocado de tristeza

Senão, não se faz um samba não

Senão é como amar uma mulher só linda

E daí?

Uma mulher tem que ter qualquer coisa além de beleza

Qualquer coisa de triste

Qualquer coisa que chora

Qualquer coisa que sente saudade

Um molejo de amor machucado

Uma beleza que vem da tristeza de se saber mulher

Feita apenas para amar

Para sofrer pelo seu amor e pra ser só perdão”


Evidentemente que aqui não vamos entrar nos detalhes miúdos da letra e interpretar quase 60 anos depois o quanto a letra pode estar desatualizada em relação a valores e ideias atrasadas.


O ponto aqui é entender como a maturidade pode nos levar a ver as coisas de maneira mais cheia de nuance e detalhes. Quando Vinícius diz que “uma mulher tem que ter qualquer coisa além de beleza”, ele parece ter captado aquilo que nós, depois de alguns anos empreendendo juntos, passamos a sentir também, deixando claro que não há nenhuma pretensão de nos igualar a Vinícius, haha.


O que para Vinícius é “ter qualquer coisa além da beleza” me parece que é o mesmo que a minha amiga disse sobre o tanquinho da turma dos dates e algo que para nós que estamos aqui construindo a marca foi ficando mais claro ao longo do tempo.


Beleza é algo importante, e mais importante que isso é entender o que é beleza para quem importa na sua vida. Eu cansei de ver casais “feios” muito mais “felizes” do que casais “bonitos”, imagino que vocês também. A gente chama isso aqui na VITO de ESTAR BEM. A beleza, o conceito de ser bonito, vem do conceito de você se sentir bem. Nós tentamos praticar isso em tudo aquilo que está à nossa volta.


Você não está bem se você é desonesto com alguém que trabalha com você, você não está bem se você é indiferente com compromissos que você assumiu, você não está bem se você está perseguindo seus ideais de vida, e nós de marca, se comparando com gente que você nem conhece, usando como parâmetro coisas que nem são importantes para você, só porque neste momento o mundo ou a sua bolha valorizam isso.


Eu pessoalmente passei por muitas transformações no meu corpo depois do câncer, perdi o cabelo que tinha me ajudado a desenvolver a The Paste, tive precocemente uma lesão que me impede de fazer o esporte que mais me dá endorfina, que me ajudava nos problemas que sempre tive com a balança, precisei passar por muita coisa para entender que o que importava era me sentir bem, me sentir útil e valorizado, sentir que estava passando pelos atritos positivos da vida adulta e que tudo ia se encaixar se seguisse aquilo que me fazia sentir bem. Ainda estou no processo, mas não consigo pensar em algo que tenha me ajudado tanto a desabrochar e viver melhor a experiência que os anos trazem, tentando juntar isso com maturidade.


Um ponto importante é que muitas vezes me sentia vivendo atritos e perrengues que não eram atritos positivos, e saber filtrar isso me fez entender melhor esse caminho para estar bem.


Não acredito que as coisas aconteçam por acaso, então foi o período que passei a conhecer gente mais interessante, e que essas pessoas era muito menos “bonitas” no conceito que eu tinha quando era mais novo.


Nesse sentido, existe um nicho de discussão nas artes sobre obras inacabadas. Gostamos dessa ideia de sermos obras inacabadas, mas qual obra inacabada você é?


Em dois opostos, entre as mais famosas obras inacabadas existe o “Retrato Interrompido” da Natalie Holland, em que ela estava fazendo um retrato do paratleta Oscar Pistorius quando saíram as notícias de que Pistorius estava envolvido na morte da sua namorada, a artista não conseguiu terminar a pintura.   


E a outra é a famosa obra de Paul Cezanne “The Turning Road”, uma obra de uma série de pinturas que ele deixa claro que estão inacabadas mas que até hoje ninguém sabe se foram por conta do problema na visão que o artista teve no fim da vida ou se eram parte do que ele sempre questionava: “Como você sabe quando uma obra está verdadeiramente acabada?”.



E você, se acha bonito? Que tipo de obra inacabada você se considera? Prometo que para a próxima tento fazer o Rafa escrever um pouco mais sobre o conceito dele de beleza.


Fiquem bem e estejam bem

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